Olá, Diário. Essa semana foi a vez de visitar o décimo andar
do nosso querido HC. Mais uma sexta, mais uma atuação, mais desafios, mais
surpresas. Assim que chegamos no local, antes mesmo de estarmos caracterizados,
passamos um tempinho conversando com um paciente (Carlinhos). A partir desse
momento já se passava pela minha cabeça como a atuação seria boa. Dava para
perceber que Carlinhos era uma criança apesar da idade (vou chutar uns 25
anos). O que ele mais gostava de falar era de vídeo game. Pensei, vai ser fácil
passar um tempão aqui. Pensei em mais e mais coisas que poderiam acontecer,
porém, toda atuação tem um (mas). Mas, no momento que subimos a máscara, eu e
Fêfo não encontramos no quarto o paciente que achávamos que a interação ia ser
total; Carlinhos até estava no 10° andar, mas, estava brincando no final do
corredor, jogando carta com um senhor que, assim como Carlinhos, deu atenção
quase que zero para nós palhaços. A gente falava e os dois só olhavam para as
cartas e continuavam compenetrados no jogo. Quando íamos saindo, Carlinhos
ainda olhou e disse, “tchau, palhaços”. Eu e Fêfo, nesse momento, pensamos que
a tão esperada interação iria acontecer. Nada disso, o paciente voltou a
mergulhar no jogo e nas jogadas de seu adversário, o senhor que nem olhava de
lado. Esse momento de quase zero interação aconteceu no final de nossa atuação.
Preferi começar falando um pouco pelo final para mostrar para mim mesmo como o
inesperado sempre vai estar presente. Sem perceber, assim que entro em algum
corredor do hospital, antes mesmo de vestir minha pele, eu sempre tento
antecipar a jogada, antes mesmo de subir a máscara objeto eu penso em algo,
penso no que fazer, como brincar. Sempre dá errado. O inesperado parece que nos
espera, nos acompanha a cada paciente abordado, a cada quarto que adentramos.
Foi em um desses “pular de olhos fechados” que caímos sem paraquedas em um
quarto que, posso dizer, foi o melhor momento de nossa atuação naquele dia. Não
digo melhor momento porque Carequinha e Carequildo souberam fazer graça ou
conseguiram arrancar sorrisos. Digo melhor momento porque sem esperar no que
poderia acontecer ou sem saber o que fazer, a interação apareceu e apareceu em
forma de conversa e em forma de carinho (mais precisamente, cafuné). Conversamos
com Camila, uma paciente muito animada e que nos deixava a vontade com seu
jeito bem espontâneo de se expressar. Conversamos com outra paciente que era o
extremo oposto de Camila, dona Marlene, ela era calada, só observava, mas
sempre com um sorriso. Dona Marlene parecia um pouco cansada ou um pouco debilitada.
Quando a vi, pensei que a interação só fosse acontecer com a paciente mais
animada. Mas o (mas) sempre aparece. Dona Marlene estava deitada recebendo
cafuné de sua filha, que por sinal também nos recebeu com um sorriso que
traduzia um, (sejam bem-vindos). Foi nesse momento que percebi que dona Marlene
poderia participar da conversa que acontecia sem ela precisar dizer uma palavra
se quer. Pedi para fazer cafuné, ela prontamente aceitou, sorriu e disse, “claro
meu filho”. Eu, enquanto alisava sua cabeça branca quis dar um beijo em sua
testa, percebi que ia melar dona Marlene com minha boca de tinta preta. No momento
nem pensei nos conselhos que um dia me deram. Sabia que era uma paciente e que
eu estava em um hospital. Mas o (mas) sempre aparece. Eu não poderia sair dali
sem ao menos dar um cheiro com meu nariz grande e vermelho. Foi o que fiz. Ela
me agradeceu com uma doçura que com palavras não sei se conseguiria explicar,
só quem estava no momento poderá entender. Ademais, fomos até outros quartos,
em muitos havia pessoas dormindo, seguíamos em frente, até que encontramos
Carlinhos no final do corredor. Mas o (mas) dessa história você já conhece,
diário.
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