Segundo dia de atuação. Melca disse que não iria desta vez,
e fico animado para ver como vai ser só com Safifi isso de atuar. É sempre uma
coisa particular estar com uma pessoa que você conhece de outros espaços atuando.
Vem um medo de que as coisas se confundam de certa forma, que a gente transfira
de uma realidade para outra e que isso atrapalhe a atuação, a espontaneidade. Mas
isso passa. Passa quase na mesma hora que aparece, esse aperreio. É só lembrar
que na hora a gente vai estar lá e não em outro lugar, e vai ser lá e não em
outro lugar e vai ser o que tiver que ser. Ficamos mais que uma hora
conversando antes de atuar, uma coisa de descarrego e de aproximação que nasceu
de uma falta e uma vontade conjunta. Jogo bastante com Safifi no setor, meio
que como se assim a gente fosse construindo uma forma de ser junto, de estar os
dois ligados um no outro.
De certa forma, começo a ficar receoso de que eu esteja
faltando com a função do palhaço por estar tão ligado em construir. Às vezes parece
que uma coisa deve se contrapor à outra. Ser palhaço é estar no agora, e
construir é pensar num futuro. Mas para construir é preciso estar atento ao que
se deve, se precisa, se pode agora. Caso contrário, a construção não se
materializa e o futuro deixa de ser possibilidade. Penso em como as coisas
aparecem descoordenadas muitas vezes na atuação, como certos elementos podem
ser unidos para criar-se algo maior, em que caibam todas as partes e mais do
que isso, um todo novo, carregado de mais sentidos e propósitos e valores, um
jogo partilhado. Penso que se todo o momento de atuação tem o potencial de
servir como base para construções conjuntas, há de se poder também pensar em construções
maiores, que se finquem em atuações diversas durante um período mais extenso.
Não acho, contudo, que esta construção possa ser planejada. Vem do que surge no
próprio espaço. Seria equivocado chegar antecipando certa produção ou forma de
construir, mas esperar sentir depois que o edifício está maior do que antes
daquele momento me parece quase imprescindível, tanto para nos fazer entender a
importância do que fazemos quanto para permitir que cresçamos atentos, presentes,
inteirados, e não é como se o edifício possa algum dia estar completo, mas
quanto maior, mais diverso, mais presente e aparente for esta construção, mais
verdade, força, atenção e calor existirá nessa nossa palhaçaria terapêutica.
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