Segunda atuação da terça, agora com Biazinha, mais um momento singular nessa minha jornada de ciclo, que tinha sido ensaido faz já algum tempo. Nos encontramos literalmente no caminho, subimos o elevador, ela bastante receosa de estarmos indo pra pediatria e eu super animado pra ajudar a descontruir isso, ou para pelo menos acompanhar isso sendo descontruído. Sou apaixonado pela desconstrução, acho que é a coisa mais doida e mágica que existe dentro da experiência de ser gente. Pensa na primeira vez que você jogou mário, os em 2D mesmo, e que você tá lá correndo e pulando nas plataformas e pulando na cabeça dos inimigos e pulando no ar livre... e de repente um bloco que estava invisível aparece naquele lugar que parecia não ter nada antes e você pega uma vida extra. Só tem como ser mágico, fascinante, surpreendente porque até aquele momento o jogo vinha construíndo de forma bastante ordenada as limitações que ele impunha na sua forma de se relacionar e interagir com aquela experiência de ser mário por aquele tempo. E quanto mais bem estabelecido for o padrão, quanto mais organizadas e direcionadas as expectativas, mais forte vai ser o momento da quebra. Quanto mais certeza temos que nunca vai ter nada onde está vazio. mais impactante vai ser encontrar de repente uma vida nova escondida alí. E isso é fundamental para a experiência de ser humano, pros nossos processos de significação e de construção de self, e pro nosso trabalho como palhaços. Somos privilegiados neste sentido porque atuamos com um tipo de linguagem que dá muito espaço para a gente perceber o quão limitador é termos pressupostos como esses pro nosso dia a dia, de que tem lugar que é bom e lugar que não é bom, coisa que a gente consegue e coisa que a gente não consegue, coisa que é fácil e coisa que é difícil, coisa que a gente já aprendeu e coisa que a gente não sabe. Da mesma forma que não vale à pena nos resolvermos com padrões previamente estabelecidos, tampouco vale à pena estar sempre passando pente fino em todos os instantes da vida para encontrar a coisa que é diferente e mágica lá. Na hora que descobrimos que existe um bloco invisível imediatamente nos perguntamos sobre todos os blocos invisíveis que perdemos ou deixamos de perceber que estavam lá até então e voltamos, pulando freneticamente pela tela, atrás de encontrar estes segredos, sem saber se aquilo foi uma vez em mil ou se o tempo todo vai ter um bloco onde não esperávamos que tivesse, e essa ação nossa vai ser moderada por quem desenvolveu o jogo com a escassez de blocos invisíveis, para que a gente entenda que é uma coisa que tem, mas que só tem às vezes e que a gente pare de correr atrás disso só e simplesmente jogue o jogo. Nenhuma das duas intenções naturais é suficiente pra gente viver. Nem trabalhar apenas com padrões nem estar sempre correndo atrás de identificar o que é novo e onde esse novo afeta nossa vida numa perspectiva pra frente e pra trás. A síntese entre uma e outra é mais interessante. É voltar depois da sessão de pulular frenético atrás de novos blocos a simplesmente jogar o jogo como estavamos antes, mas agora sabendo que os blocos podem aparecer, crescendo assim a forma como interagimos com os níveis porque estamos agora mais experientes, mais cheios de experiência, carregados no sentido de atentos a esse novo tipo de estímulo. Estamos mudados, ainda que pouco, e vai ser dessa mudança que novas poderão surgir, e cresceremos sempre, porque sabemos valorizar aquele momento do bloco invisível, mas sabemos também que se o tempo todo estivermos esperando encontrar um bloco invisível a descoberta perderá sentido, graça, beleza, impacto.
Adorei ter estado com Biazinha naquele momento, pra mim foi muito bom, e espero que para ela também tenha sido. Pude ser algumas coisas do meu palhaço com mais clareza dessa vez, alguns jeitos de ser palhaço que por vezes não encontro nas minhas atuações semanais:
- estar no suporte aos demais quando Biazinha entrava em um momento mais profundo e sentido com alguém que estava mais cabisbaixo, precisando de um outro tipo de atenção,
- estar preocupado com que as pessoas não se machuquem ou façam besteira, cuidar quase que de modo maternal.
- ser malcriado um pouco também, mas sempre ligado em fazer isso sem atropelar as defesas das pessoas.
No mais, não posso conter a minha vontade de ler o que ela escreveu. Não sei tampouco se ela já postou, mas quero muito. Tô querendo muito ler os DBs de quem atuou comigo, acho que só li uns de Aaaaah no semestre passado. Vou cobrar isso das minhas duplas. Tá faltando na minha vida esse lado das coisas. Enfim, sempre tem um universo inacabável de questões e de vivências que não entram nesses textos, você sabe como é Yo. Essa é uma perspectiva, uma forma de ver sentido no que rolou, aquilo que me salta. Quero ler de Biazinha para ouvir outra, reconhecer o valor dessa outra forma de pensar e ver e dar sentido ao que aconteceu, para que eu também possa crescer, encontrar novos blocos invisíveis no meu caminho dentro desse trabalho de ser palhaço.
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